domingo, 31 de outubro de 2010

Quando a brincadeira deixa de ser divertida


Esqueleto humano. Essa era a forma como Carlos Oliveira (nome fictício para manter a identidade do jovem preservada) era chamado na escola pelos demais alunos da classe. Alto, magro e tímido, ele sempre sentava no fundo da sala e evitava falar com qualquer um. Diariamente, o jovem de 14 anos era alvo não só de apelidos maldosos, como também de brincadeiras violentas. Chegou-se ao ponto de fazerem uma votação entre os alunos da escola para saber quantos o detestavam e o queriam fora da classe. A situação até amenizou depois que Carlos disse não gostar desse tipo de “brincadeiras”.

Thais Silva (nome também fictício), 24, há quatro anos teve sua conta, numa rede social da internet, alvo de recados com ameaças e ofensas por gostar de moda e ter sido uma das primeiras da faculdade a ter um novo modelo de celular pink. O infortúnio partia de um perfil chamado Bozo e com a foto do famoso palhaço. Thais chegou a ser ameaçada de seqüestro por Bozo, que garantiu levá-la junto com o celular rosa. Quatro meses depois, a conta foi ativada como um perfil normal e a universitária descobriu quem era o palhaço. Ela não reagiu, mas até hoje não entende o porquê da garota ter feito tudo isso.

Ana Paula (nome fictício), 15 anos, deficiente física, fã de bandas de rock e de reality show, criou um fake no Orkut para conversar com outros perfis da rede. Um perfil sem fotos a adicionou e começou a fazer ameaças, além de adicionar suas amigas e dizer que Ana falava mal delas para outras pessoas. As amigas da escola acreditaram e se afastaram dela, chegando a uma discussão em que uma delas tentou derrubar Ana de sua cadeira de rodas. Indignada com o caso, a mãe da jovem contratou um advogado e levou a polícia na escola. Ana Paula contou para uma de suas amigas que o advogado iria descobrir quem era o autor do perfil que a estava ameaçando; sua amiga ficou nervosa e pediu para que deixasse o caso de lado. Uma hora depois o perfil fake foi deletado da rede. Ana Paula mudou de turno e estuda em uma outra turma para não ter que esbarrar com suas antigas amigas.

Esses três jovens são casos práticos de bullying, que vem se tornando cada vez mais freqüente no Brasil e no mundo. Bullying é um termo em inglês que grosseiramente poderia ser traduzido com “tiranizando”. É uma expressão utilizada para descrever todas as formas de violência física ou psicológica, intencionais e repetitivas, exercidas por um ou mais indivíduos com o objetivo de intimidar e agredir outras pessoa sem ter possibilidade ou capacidade de se defender.

Segundo pesquisa realizada pela ONG Plan Brasil com 5.168 alunos em cinco regiões do país, 10% deles já sofreram ou praticaram bullying. Com relação ao cyberbullying – tipo de bulliyng praticado na internet, com os mesmos objetivos (ridicularizar, humilhar, ameaçar) - 16,8% foram vítimas e 17,7% praticaram. Esses valores permitem concluir que o bullying na rede já é mais freqüente que ao vivo. Thais e Ana Paula se encontram nesses 16,8%, junto com tantos outros jovens e crianças que não encontram na escola nenhum programa de enfrentamento ao bullying, assim como muitas vezes não contam com a ajuda dos pais que somente culpam a escola, e todos ficam nesse jogo de empurra-empurra.

É difícil haver uma denúncia por parte da vítima. Isso se dá porque apontar os que praticam o bullying pode agravar a situação e pelo sentimento de humilhação que é passar pelo bullying e declarar que passou. É uma dupla sensação de impotência, de fraqueza. E tudo pode acabar sendo visto com apenas uma “grande brincadeira”, no entanto, é preciso deixar clara a diferença: é brincadeira quando há equilíbrio e espaço para todos e não quando aquele que tem mais força, física ou psicológica, humilha o mais fraco, que apresenta aspectos psicológicos como timidez e baixa auto-estima.


Por: Arthur Rocha e André Araújo

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